quinta-feira, 13 de maio de 2010

Cannes e Robin Hood


por Marcelo Miranda

Russel Crowe entra na sala de conferência do Palácio dos Festivais e se senta. Uma horda de fotógrafos o aguarda diante da mesa e logo pede que ele se levante. Crowe fica de pé, faz pose, careta e, por fim, sorri, meio constrangido. Os cliques se multiplicam, os flashes esbranquiçam mais e mais o rosto do ator. Pode não parecer, mas este é o início da 63ª edição do Festival de Cannes, o mais importante e autoral do cinema mundial. Crowe veio à Riviera Francesa divulgar "Robin Hood", superprodução dirigida por Ridley Scott, que abriu ontem o evento.

Um filme grande (nem sempre um grande filme) tem sido a tônica do primeiro dia de Cannes já faz uns bons anos. A escolha de "Robin Hood", para além de toda a pompa, tem a ver com uma certa falta de títulos de peso midiático prontos em tempo suficiente para carregar este ano tropas de jornalistas ao festival - são aproximadamente 4.000 credenciados.
O que importa, afinal, é "Robin Hood" - cuja estreia no Brasil já será amanhã - abrindo o evento fora de competição.

O antigo personagem de matinês marcou presença nas telas francesas, mas não seu diretor. O inglês Ridley Scott precisou cancelar a vinda a Cannes, por recomendação médica (ele fez uma cirurgia no joelho). Scott, que exibiu no festival seu filme de estreia, "Os Duelistas", em 1977, enviou mensagem frisando a vontade frustrada de estar aqui.

Coube ao australiano Russel Crowe - sorridentemente ajudado pela conterrânea e colega de elenco Cate Blanchett - conduzir a entrevista. Bem-humorado, Crowe não aparentava a figura rabugenta cuja persona ele próprio não se cansa de alimentar: disparou piadas a cada nova resposta, assumiu a paixão pelo futebol, ironizou os próprios jornalistas. E, claro, falou de Robin Hood e do imaginário em torno do personagem.
"Não nos lembrávamos de um filme no qual Robin era mostrado como um indivíduo e nem com suas reais motivações", disse o astro, também produtor executivo do longa. "Me pergunto se ele tem ambições políticas, econômicas, se ele quer ir a Wall Street, ou se ele é simplesmente um cara tentando ajudar as pessoas a viver. Acredito que, se existisse hoje em dia, Robin Hood certamente não ia correr para estourar na mídia".

Blanchett, igualmente à vontade, diz não ter se inspirado em nenhuma outra encarnação anterior de Marian (uma das mais famosas é a de Audrey Hepburn em "Robin e Marian", de 1976, com Sean Connery). "Foi até bom, pois criei uma figura própria". Ao contrário dela, Crowe chegou ao set embebido numa maratona de filmes e séries protagonizados pelo serelepe ladrão da floresta de Sherwood. "Vi de tudo, das encarnações do Douglas Fairbanks e Errol Flynn a um programa de humor feito pelo Mel Brooks".

Diferente das tradicionais versões do herói que rouba dos ricos para dar aos pobres, o filme de Scott mergulha numa faceta pouco conhecida: a de Robin como um guerreiro a serviço da Inglaterra contra o exército francês e o processo até ele se tornar a figura tão marcadamente reconhecida de salvador dos injustiçados. "Inserir elementos históricos gera curiosidade no público, e é isso que um filme como esse precisa ter", definiu Crowe. "As pessoas querem saber sobre como uma figura egoísta provoca uma revolução".
Por diversas vezes, Crowe se desviava do filme e falava de futebol. Ao responder à pergunta de uma jornalista da África do Sul, o ator brincou "Tem muitos países que podem ganhar a Copa, mas a Austrália é que vai dominar o futebol mundial", apostou.

*Originalmente publicado em O TEMPO no dia 13.5.2010

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